Opinião
Planos de saúde sem PS e o risco de ainda mais sobrecarga ao SUS
Natália Soriani é advogada especialista em Direito Médico e de Saúde.
Natália Soriani é advogada especialista em Direito Médico e de Saúde.

A ideia de criação de uma nova modalidade de plano de saúde pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), mais barata e sem a cobertura de Pronto-Socorro para atendimentos de urgência, bem como sem internações e terapias, segue dando o que falar. Recentemente, o Ministério Público Federal (MPF), por meio da Comissão de Saúde da Câmara do Consumidor e da Ordem Econômica, publicou uma nota técnica com críticas à proposta.

Na nota técnica, o órgão alerta para falhas significativas na ideia de uma cobertura restrita a consultas eletivas e exames, e que devem ser sanadas antes de qualquer decisão de disponibilizá-la no mercado. A falta de estudos mais aprofundados que dimensionem o impacto dos planos populares para aqueles que já têm convênios médicos tradicionais foi um dos pontos de atenção do documento que o MPF enviou para a ANS. Outro item destacado foi o fato dessa modalidade não estar prevista na lei que regulamenta os planos de saúde, o que tornaria ilegal sua comercialização como tal, devendo a agência elaborar um regramento específico para tratar dos agentes regulados, dos regimes de oferta e contratação, das coberturas oferecidas e das garantias, entre outras obrigações legais.

Os representantes do Ministério Público Federal reforçam ser fundamental prever número de pessoas que podem migrar dos planos de saúde completos para os restritos, o que levaria uma maior sobrecarga ao já saturado Sistema Único de Saúde (SUS) em casos de necessidade de atendimento mais complexo.

A ANS alega ter como motivação para a criação dessa nova modalidade de cobertura médica a oportunidade de ampliar o acesso dos brasileiros aos planos de saúde, especialmente aqueles que não conseguem arcar com os custos dos convênios tradicionais.

Diante das justificativas e críticas à iniciativa da ANS, é fundamental refletir e colocar em maior relevância o que está em jogo: a saúde do brasileiro. Nesse sentido, vale destacar que a disponibilização dessa modalidade de plano sem arquitetar uma rede apropriada de suporte às emergências pode não só deslocar problemas para o SUS como também incitar um cenário em que esses planos de saúde, com baixa cobertura, se tornem padrão de mercado, com graves implicações para o atendimento hospitalar.

Como exemplo de vulnerabilidade para o próprio beneficiário desse tipo de plano, um paciente que tenha sofrido um Acidente Vascular Cerebral (AVC) que não possa contar com total cobertura para internação e tratamento intensivo pode vir a ter sequelas graves ou até mesmo vir à óbito, justamente em decorrência da falta do total cuidado ofertado pelo plano.

Para além de rede apropriada, bem lembra o MPF em sua nota técnica para a necessidade de regulamentação específica, esta que seja capaz de preservar a integridade tanto dos serviços públicos quanto privados, por meio de uma arquitetura sólida de compliance que contemple, inclusive, prontuários eletrônicos integrados entre os sistemas de saúde. Junta-se a isso a necessidade de criação de mecanismos que viabilizem eficaz fiscalização que coíba abusos, negligências ou outras condutas nocivas e ilegais ao consumidor.

Estamos falando de milhões de vidas envolvidas e, por toda a relevância que o tema tem, a decisão de disponibilizar ao mercado nacional essa modalidade de convênio merece ser mais profundamente debatida, com participação do poder público, de entidades não governamentais, do setor privado, bem como de profissionais de saúde, operadoras de planos de saúde e órgãos de defesa do consumidor. Na saúde, não dá para errar.

*Natália Soriani é advogada especialista em Direito Médico e de Saúde, sócia do escritório Natália Soriani Advocacia.

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